Era um vendedor de flores que tinha como profissão ser viúvo de uma esposa que não morreu. Combinação incrivelmente dolorosa para se conviver. Todos os dias os mais diversos casais entravam e saiam de sua loja. Sempre sorridentes, sempre alegres, com aquela inocência e esperança que apenas casais recém formados apresentam.
Compravam chocolates, pequenos bonequinhos de casais ( os casais de sapo faziam especial sucesso na sua cidade) e outras obras. Mas o que realmente ele fazia bem eram arranjos de flores, afinal todos os dias criava um novo para a falecida que ainda vive. Fazia isso pelo pleno prazer de simplesmente ver o sorriso em seu rosto cada vez que era surpreendida por um novo presente.
Um belo dia no entanto, não houve sorriso, não houve ramalhete, morreu a esperança. Ela não estava mais lá, fugira com um novo amor. Pelo menos é isso que se conta, já que desde então ele nunca mais havia dito uma palavra. Entretanto um certo dia chuvoso, já perto do final do expediente, uma moça entrou em sua loja. Percorreu a loja inteira, parou diante de uma rosa e chorou. Chorou copiosamente todas a palavras e mágoas que nunca ousara falar.
Olhou pra trás então, e, apesar olhando para o vendedor de flores, percebeu que eram iguais. Cascas vazias sem alma que escolheram nunca se recuperar do mal que os afligiu. Foi embora sem dizer uma palavra sobre o que sentiu. Passou a voltar naquelas lojas todos os dias.
Até que um dia trouxe junto de sua presença uma foto. Uma foto de ela, radiante, de um modo que parecia estar dançando. A graça de sua imagem preencheu os pulmões do abatido vendedor de flores, de uma maneira tão violenta que foi obrigado a dizer:
-Gostaria muito de dançar com você.
-Mas eu não sei dançar.
-Eu te ensino.
Antes de ouvir a resposta ele correu para buscar sua vitrola no quarto dos fundos. Ao voltar não houve sorriso, não houve ramalhete, morreu a esperança. Ela não estava mais lá. Mas dessa vez o amor havia deixado um recado.
"Quero dançar com você
se até lá estiver namorando
digo a sua namorada
eu te amo".
Ficou feliz, seria aquela então a flor que o vendedor de flores sempre esperou receber. Desde então todos os dias ele aguardava aquela mulher, a volta da dançarina. O tempo passou e ele nunca mais a viu. Um dia então, resolveu limpar o espelho, e com ele limpar o restante de esperança que tinha de um amor correspondido. Chegando perto do objeto, percebeu que um pedaço de pano havia grudado na tinta que a moça utilizara para pintar o recado. Retirando esse pedaço de pano, finalmente entendeu a mensagem.
"Quero dançar com você
se até lá estiver namorando
diga a sua namorada
eu te amo."
Frase do dia:
"Acordei e me olhei no espelho, ainda a tempo de ver meu sonho virar pesadelo"
Paulo Leminski
terça-feira, 28 de maio de 2013
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